quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

[... escolhe pois a vida, para que vivas... Dt 30,19]










Enquanto podia, aconselhava, ouvia, ponderava, levantava prós e contras, contava de sua própria experiência, projetava algumas delas, ocultava outras, etc. 
Fez tudo o que pode para que ele não fosse pelo caminho que parecia traçar para si. No entanto, a partir do momento que  ele decidiu seguir o caminho que escolheu, ela fez de tudo para ajudá-lo. Até testemuhou o que aos olhos dela era um erro. Aceitou o fato de que ele tomou a decisão que achava melhor para si. 

Isso quando abandonou o emprego, isso quando resolveu morar de aluguel ao invés de comprar uma casa, isso quando resolveu namorar alguém que claramente não tinha nada a ver com ele. Mesmo com todos alertas ela resolveu deixá-lo seguir o que achava melhor. Não se eximiu da sua responsabilidade enquanto quem ama, não tomou para si responsabilidade que não era dela, não foi indiferente à demanda do outro, mas deixou o outro livre e ajudou no que pôde e o quanto pôde. Mas fez assim porque o amava, porque compreendia que por mais que discordasse, por mais que alertasse, a decisão, por mais errada que fosse a seus olhos, cabia somente a ele. Nada fez para se colocar como obstáculo, pelo contrário, tudo o que pôde fazer para ajudar, ela fez. 

Não mereceria ela a mesma credibilidade agora que a situação se inverteu? Não deveria ele agora fazer tudo o que estivesse ao seu alcance para ajudá-la a levar a cabo sua decisão? No entanto agora ele se esconde atrás de racionalizações, se esconde atrás de planilhas. Planilhas essas que não fez diferença alguma na hora  de abandonar o emprego. Racionalizações essas que foram deixadas de lado quando a sua demanda se impôs, mas que agora serve de desculpas para se eximir da ajuda possível.

É sempre possível usarmos um juízo para o outro e não sermos coerentes o suficiente para usarmos o mesmo juízo para nós mesmos. Da mesma forma que há pessoas que são muito duras com os outros mas ao mesmo tempo são bastante condescendentes consigo. Para o outro todo o peso das racionalizações, para mim nem tanto peso assim, e assim a vida segue como que normalmente diante das incongruências destas posições. Os já conhecidos "dois pesos e duas medidas" acabam falando mais altos diante dos nossos interesses e isso é algo extremamente humano, mas nem por isso seja algo que devemos nutrir, afinal, seria bom se fôssemos justos o tempo todo; tanto conosco como com os outros.

Há também aqueles que são extremamente severos consigo e extremamente condescendente com o erro dos outros. Esse segundo tipo também encontramos aos montes em nossa vida. O grande desafio é encontrar o meio-termo entre essas duas situações e tentarmos, na medida do possível, nos tornar melhores em relação ao outro. Ajudar o outro sempre que possível e não ser empecilho para que o outro tome as suas decisões. No que depender de nós devemos ter sempre o coração disposto a ajudar o próximo para que ele se realize e para que ele sempre se responsabilize pelos seus atos.

Toda escolha envolve uma perda. Escolher é sempre perder algo. Enquanto adultos cabe a nós reconhecer o direito do outro de tomar as suas próprias decisões, o direito do outro de escolher o que achar melhor para si. Por mais idiota que possamos achar a escolha do outro não compete a nós decidir por ele. Se solicitados podemos expor nossas opiniões, nossos pontos a favor e contra tal decisão, mas sempre tendo em mente que cabe apenas ao outro tomar tal decisão. A nós cabe respeitar  e torcer para que o outro escolha o que for melhor, cabe a nós torcer para que o outro escolha a vida e viva. E isso é sempre um grande desafio para nós.

Que estejamos sempre prontos a aconselhar e ajudar o outro naquilo que sabemos, mas sem nunca tirar do outro a responsabilidade e o seu direito/dever de escolher o seu próprio caminho.


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