quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Fé e crédito - Observações de Giorgio Agamben









Para entender o que significa a palavra "futuro", é preciso, antes, entender o que significa uma outra palavra, que não estamos mais acostumados a usar, senão na esfera religiosa: a palavra "fé". Sem fé ou confiança, não é possível futuro. Só há futuro se pudermos esperar ou crer em alguma coisa.

Sim, mas o que é fé? David Flüsser, um grande estudioso da ciência das religiões – também existe uma disciplina com esse estranho nome – estava justamente trabalhando sobre a palavra pistis, que é o termo grego que Jesus e os apóstolos usavam para "fé". Um dia, ele se encontrava por acaso em uma praça de Atenas e, em um certo momento, levantando os olhos, viu escrito em caracteres capitais, à sua frente: Trapeza tes pisteos. Estupefato com a coincidência, olhou melhor e, depois de alguns segundos, se deu conta de que se encontrava simplesmente diante de um banco: trapeza tes pisteos significa, em grego, "banco de crédito".

Eis qual era o sentido da palavra pistis, que ele estava tentando entender há meses: pistis, "fé", é simplesmente o crédito do qual gozamos junto de Deus e do qual a palavra de Deus goza junto de nós, a partir do momento em que acreditamos nela.

Por isso, Paulo pode dizer em uma famosa definição que "a fé é substância de coisas esperadas" [ou, segundo a versão da Bíblia Pastoral, "um modo de já possuir aquilo que se espera"]: ela é o que dá realidade àquilo que não existe ainda, mas em que acreditamos e confiamos, em que colocamos em jogo o nosso crédito e a nossa palavra. Algo como um futuro existe na medida em que a nossa fé consegue dar substância, isto é, realidade às nossas esperanças.

Mas a nossa época, como se sabe, é de escassa fé ou, como dizia Nicola Chiaromonte, de má-fé, isto é, de uma fé mantida à força e sem convicção. Portanto, uma época sem futuro e sem esperanças – ou de futuros vazios e de falsas esperanças. Mas, nesta época muito velha para crer realmente em alguma coisa e esperta demais para estar verdadeiramente desesperada, o que será do nosso crédito, o que será do nosso futuro?

Porque, olhando bem, ainda há uma esfera que gira totalmente ao redor do eixo do crédito, uma esfera em que acabou toda a nossa pistis, toda a nossa fé. Essa esfera é o dinheiro, e o banco – a trapeza tes pisteos – é o seu templo. O dinheiro nada mais é do que um crédito, e sobre muitas notas de crédito (sobre a libra esterlina, sobre o dólar, mesmo que não – sabe-se lá por que; talvez deveríamos começar a suspeitar disso – sobre o euro) ainda está escrito que o banco central promete garantir esse crédito de algum modo.

A chamada "crise" que estamos atravessando – mas aquilo que se chama de "crise", isso já está claro, nada mais é do que o modo normal em que funciona o capitalismo do nosso tempo – começou com uma série insensata de operações sobre o crédito, sobre créditos que eram descontados e revendidos dezenas de vezes antes que pudessem ser realizados. Isso significa, em outras palavras, que o capitalismo financeiro – e os bancos que são o seu órgão principal – funciona jogando sobre o crédito – ou seja, sobre a fé – dos homens.

Mas isso também significa que a hipótese de Walter Benjamin, segundo a qual o capitalismo é, na verdade, uma religião e a mais feroz e implacável que jamais existiu, porque não conhece redenção nem trégua, deve ser tomado ao pé da letra. O Banco – com os seus funcionários pardos e especialistas – tomou o lugar da Igreja e dos seus padres e, governando o crédito, manipula e gerencia a fé – a escassa e incerta confiança – que o nosso tempo ainda tem em si mesmo. E o faz do modo mais irresponsável e sem escrúpulos, tentando lucrar dinheiro com a confiança e as esperanças dos seres humanos, estabelecendo o crédito de que cada um pode gozar e o preço que deve pagar por isso (até mesmo o crédito dos Estados, que docilmente abdicaram à sua soberania).

Desse modo, governando o crédito, ele governa não só o mundo, mas também o futuro dos seres humanos, um futuro que a crise torna cada vez mais curto e a prazo. E se hoje a política não parece mais possível, isso se deve ao fato de que o poder financeiro sequestrou de fato toda a fé e todo o futuro, todo o tempo e todas as expectativas.

Enquanto essa situação durar, enquanto a nossa sociedade que se acredita laica permanecer subserviente à mais obscura e irracional das religiões, será bom que cada um retome o seu crédito e o seu futuro das mãos desses tétricos pseudosacerdotes, banqueiros, professores e funcionários das várias agências de rating. E talvez a primeira coisa a fazer é parar de olhar apenas para o futuro, como eles exortam a fazer, para, ao contrário, voltar o olhar para o passado.

Apenas compreendendo o que aconteceu e, sobretudo, tentando entender como pôde acontecer, será possível, talvez, reencontrar a própria liberdade. A arqueologia – não a futurologia – é a única via de acesso ao presente.

Artigo de Giorgio Agamben publicado no jornal La República em 16/02/2012.
Disponível no link http://www.ihu.unisinos.br/noticias/506810-quando-a-religiao-do-dinheiro-devora-o-futuro-artigo-de-giorgio-agamben

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Solução inconclusiva para uma amiga querida






Às vezes as coisas não saem como planejamos,
As águas se tornam mais turvas do que esperávamos
A visão, antes tão cheia de sonhos passa a ver apenas as ondas fortes que insistem em permanecer...
Os ventos fortes batendo contra os alicerces,
Nossas convicções sendo desfeitas
Nossos sonhos desfacelados
Pensamos em desistir
Pensamos em não nos mover
Pensamos que talvez o melhor a se fazer seja o se conformar
O deixar a vida seguir seu curso
Deixar "nas mãos de Deus", pois ele teria um plano para tal momento


E quando vemos, passaram-se 5, 6, 8 anos e não nos movemos...

O que faltou? Que motivação seria esta que deveria ter (dadas as circunstancias adversas) e não tenho?

Talvez sofri do "complexo de Atlas" e quis sustentar todas as coisas quando não conseguia sustentar nem a mim mesmo, e nesse processo me cansei mais que deveria, e as forças se foram. Logo agora que mais precisava delas...

Acaba que caímos no paradoxo do desejo de mudar, mas sem o desejo de agir, e acabamos nos frustrando duas vezes, tanto pelo primeiro quanto pelo segundo...

A quem culparemos? A mim? A situação? As condições materiais de existencia? A Deus? E se descobrimos que não há culpados que possam ser chamados ao tribunal?

O que faremos em vista destas coisas? A quem recorreremos?

O amanhã surge como um grande consolo e um grande desafio, afinal, se há a esperança do amanhã há a esperança da mudança. Falar que "só depende de nós" é talvez ser muito otimista em questões onde o otimismo se torna um mal e não um bem.

Concordo que várias coisas depende de nós, algumas nem tanto, mas no que depender apenas de nós, tentemos subjugar as adversidades e ver o amanhã como vazio que possibilita a construção do novo, mas sempre com a consciencia de que este novo pode não se realizar.

No final, o que valerá talvez será o salto para uma atitude diferente diante do mundo, diante da vida e talvez a partir deste salto algo em nós mude e poderemos finalmente nos mover em direção a alguma mudança...

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Brainstorm 2006






Encontrei este texto no meu email e vi que não tinha publicado tal texto. Não sei porque, mas reli e achei que ainda fazia sentido... O texto é de 2006, por isso achei bastante interessante, embora não lembre o contexto, nem a quem me refiro. Talvez por isso ele fique ainda mais interessante.


O telefone tocou !!! ah como eu gostaria que tivesse sido vc ao telefone e não um cara perguntando sobre data de habilitação !!!!
De uma certa forma eu sabia que não era vc. Algo lá no fundo me dizia isto, mas a esperança de que fosse ainda batia. Atendi o telefone e realmente não era vc quem ligava. c'est la vie !!!

Acho que é importante passarmos dias como estes, dias onde tudo o que vc quer é apenas alguém para conversar e compartilhar coisas do dia.... nada mais.

São dias assim que nos faz crescer, amadurecer, e perceber que apesar de tudo é bom ainda estar vivo. Como já dizia o eclesiastes: no dia da alegria, se alegre nele, mas quando vier o dia de tribulação, lembre que deus fez tanto um quanto o outro.

Ah se eu conseguisse expressar o quanto que eu sinto sua falta hoje, e não só hoje, mas todo dia que eu não te vejo...

As vezes as coisas mais simples, ficam tão complicadas... Hoje por exemplo, era simplesmente uma conversa que eu queria, coisas que se faz todos os dias... mas hoje, nem gtalk, messenger, globo chat, telefone, nada !!!! nestas horas é de se questionar a tal globalização onde todos estão juntos e vc não tem ninguém para conversar. a aldeia global dos mudos !!!

Pesquisas já constataram isso que estou passando hoje, em frente a um computador digitando o que eu gostaria de estar conversando com alguém. O e-mail no entanto, me ouve enquanto escrevo, mas ele também não pode me responder... que pena !! nem tudo é perfeito, ah se ele pudesse falar.. me responder, conversar comigo... dizer que se importa...

Infelizmente ou felizmente nem sempre as coisas são como achamos que seria.

Me ocorre um pensamento : fale com Deus, converse com ele.

Realmente é uma boa alternativa, mas hoje prefiriria conversar com Deus nas pessoas, obras de suas mãos. Conversar com a sua expressão mais genuína. a saber: pessoas.

Pelo menos posso escrever. A dor as vezes se vai depois de uma noite de sono, as vezes não, o choro pode durar uma noite inteira, mas a alegria vem ao amanhecer. isso é confortante.

Tantos planos tantos projetos, todos para sermos felizes, ou fazer o outro feliz.Amar, este é o sentido, se não de tudo, pelo menos de muita coisa.

Seria tão bom se as palavras conseguissem realmente expressar os pensamentos ! Isso seria muito confortante, agora provavelmente eu estaria bem melhor, mas que abismo há entre o pensamento e a palavra ! O problema da significação !!!

Ironias a parte, se houver um amanhã que ele seja um belo dia, do contrário, vivamos o hoje e aproveitemos tudo o que ele nos propõe, tanto a tristeza, quanto a alegria !!!
Já nos diria alguém que não lembro quem agora: "uma hora neste mundo, vale mais do que toda a eternidade no mundo que virá."

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Sobre Pinheirinhos



Junto dos rios de babilônia, ali nos assentamos e choramos, quando nos lembramos de Sião.
Sobre os salgueiros que há no meio dela, penduramos as nossas harpas.
Pois lá aqueles que nos levaram cativos nos pediam uma canção; e os que nos destruíram, que os alegrássemos, dizendo: Cantai-nos uma das canções de Sião.
Como cantaremos a canção do SENHOR em terra estranha? Salmos 137:1-4

Estranho como vários problemas que acontecem no Brasil e no mundo nao vira alvo da crítica evangélica. O cristianismo que surgiu como forma de protesto, na heranca dos profetas do Antigo Testamento se ve agora do lado dos opressores, se ve do lado de quem detem o poder e por isso, na maioria das vezes se cala ao invés de protestarem. Ao invés de ir a luta tentam entoar canticos enquanto o mundo vai sendo oprimido.

Até no salmista houve mais compaixao quando canta no Salmo 137.

Como entoar canticos em Terra estranha? Como permanecer indiferente diante da opressao que acomete nossos irmãos que sofrem na maos dos opressores? Um protestantismo que não protesta perde a sua função. Se o mundo em que vivemos não aparece a nós como "terra estranha", há algo de errado na forma como nos relacionamos com o mundo.

Os opressores pedem que nos alegremos, os opressores pedem que não alcemos nossas vozes contra o que fazem, e passivamente se aceita isto com muita facilidade dentro da igreja evangélica. Ao invés de encararem os problemas, na maioria das vezes o que se vê é uma afirmação de que "este é o plano de Deus" "Deus tem algo a ensinar", no entanto não é isto que nos demonstra o Salmo citado acima. Os últimos versículos dele afirmam "Ah! filha de babilônia, que vais ser assolada; feliz aquele que te retribuir o pago que tu nos pagaste a nós.
Feliz aquele que pegar em teus filhos e der com eles nas pedras.".


Ao invés de "cobrir as correntes com flores" o salmista faz uma crítica e expressa o desejo de vingança contra os opressores. Um lidar com a ira de forma muito humana (condição esta várias vezes esquecidas pelo meio evangélico), um não negligenciar do desejo de ver o mal sendo vingado. Não há passividade na fala do salmista, aquele que oprime deve ser punido, o opressor não deve viver como se nada acontecesse.


Esta apatia evangélica diante dos problemas do mundo é bastante sintomática, pois demonstra uma visão ainda muito recorrente neste meio da idéia de "peregrino". A noção de que somos "peregrinos em terra estranha" ainda aparece muito forte para vários setores da igreja evangélica. Enquanto peregrino, não se deve preocupar com o que acontece no mundo, afinal, "vós não sois deste mundo". Esta ideologia da indiferença em relação ao mundo está longe de ser a proposta evidenciada pelos profetas do Antigo Testamento, assim como pelo próprio Cristo que sempre se colocou contra toda forma de injustiça social.

O caso de Pinheirinhos deveria mobilizar a igreja evangélica muito mais que os "eventos" promovidos pela rede Globo. Veria-se o "poder de Deus" se o povo que se diz evangélico, agisse como agentes do reino no mundo. O reino de Deus é um reino de paz, justiça e amor, e nós, enquanto humanos aqueles responsáveis por trazer o reino de Deus a terra. Afinal, "vem a nós o vosso reino" evidencia a dinamica do reino que desce e não de um povo que sobe.

Como entoar canticos em uma terra tão estranha? Como falar de "atos profeticos" se negligencia a dinamica dos profetas que tinham como mote de suas falas as críticas à sociedade de sua época, a crítica a opressão, a crítica a supressão dos direitos dos que não tinham parte na terra? Como dizer que se é cristão se o mundo humano não o toca ? Claro que é extremamente mais fácil buscar o sobrenatural a tentar mudar o material. Se a questão é meramente sobrenatural, o principal agente deve ser Deus e a ele cabe a responsabilidade de mudar tudo no tempo dele; agora, se a relação é material, cabe a nós enquanto seres materiais mudarmos o que pudermos mudar; "tirar a pedra" (Jo 11:39) para que algo aconteça.

Pinheirinhos é uma destas pedras que precisam ser removidas, e só será removida se houver o protesto. Protesto este que é o mote do protestantismo. O protestantismo não pode se calar diante do que temos visto e ouvido nestes dias, coisas que não acreditaríamos se nos fossem contadas. A opresão, a injustiça, a sociedade dominada pelas dinamicas do capital, a infração dos direitos humanos, etc, contra tudo isto o protestantismo deveria levantar a sua voz, para que realmente possa ser chamado de protestantismo. Só a partir desta ação efetiva no mundo é que se é capaz de "levar as boas novas".

A ausencia de responsabilidade pelo mundo material acaba por reduzir a nada o campo de atuação do crisianismo no mundo. Enquanto o cristianismo se mantiver apático em relação a questões como Pinheirinhos, os conflitos na áfrica, dentre outros, e ficar pensando apenas na "vida porvir",( incerteza que tenta passar por certeza) muito das críticas de Marx, Nietzsche e Freud se aplicarão a eles.

Só mesmo quando o cristianismo assumir seu papel de agente modificador do mundo, não ideologicamente, mas materialmente será possível ve-lo como um avanço da humanidade e não como ideologia opressora.


domingo, 15 de janeiro de 2012

Quando o amor lhe bater a porta



Quando o amor lhe bater a porta, nao arrume desculpas para nao deixá-lo entrar. Abra as portas, de-lhe lugar, pois verás que a companhia dele fará com que seus dias sejam melhores.

Nao queira que ele vá embora rapidamente, nao o apresse, deixe que fique, que tome residencia, crie morada, seja um hóspede constante. Assim que se tornarem íntimos e olhares para trás, verás que a melhor coisa que fizeste foi te-lo como amigo, foi se fazer íntimo dele, foi ter se aberto a ele.

Quando o amor lhe bater a porta nao se prenda a coisas que passarao rapidamente, tente apreender o que realmente ele lhe traz, as oportnidades que ele lhe apresenta. Perceba que na simplicidade dos gestos muita coisa pode ser dita e um ouvido atento estará pronto para ouvir...

Quando o amor lhe bater a porta, o receba de coracao aberto, sem ressalvas, sem temores, sem expectativas alucinantes, afinal, as vezes ele fará com que todas as expectativas anteriores sejam deixadas de lado em nome da simplicidade que ele lhe apresenta.

"Eis que estou a porta e bato, se ouvires a minha voz, e abrires a porta, entrarei em sua casa, cearei com ele e ele comigo" Ap. 3:20 - Eis o convite que o amor nos faz. Deixe-o entrar, comam juntos, se tornem amigos, e verás que depois, nunca mais quererá que ele se vá.

sábado, 31 de dezembro de 2011

Feliz ano novo !



Nietzsche já nos falava há algum tempo atrás do "Eterno retorno do mesmo". Uma idéia bastante interessante muito assimilada desde tempos imemoriais por diversas religiões orientais.

Idéia esta que envolve a existencia de um universo eterno, que não teria um início, nem teria fim, mas seria cíclico. (um retorno aos primeiros pré-socráticos para os quais esta idéia é central)
A idéia de um universo eterno que depois da hipótese do Big Bang ficou tão desacreditada começa a ganhar força novamente dentro do cenário físico com diversos experimentos sendo feitos para tentar mostrar diversas falhas do modelo do Big Bang.
Uma espécie de choque em algumas correntes cristãs que suam até hoje para tentarem conciliar a "existencia do Big Bang com a existencia da criação", afinal, "Deus poderia ter criado tudo a partir do Big Bang" dizem alguns mais liberais.

No entanto, a idéia de um "início" para todas as coisas acaba partindo de um pressuposto de causa não causada, isto é, todas as coisas devem ser causadas por outra, e se assim for, é necessária (e aqui dizemos logicamente) que haja uma causa não causada de todas elas. Uma das 4 causas de Aristóteles que assimilamos tão bem sem nem mesmo saber que a idéia remonta ao estagirita.

Esta idéia de causa não causada foi assimilada pelo cristianismo principalmente por São Tomás de Aquino que definiu tal causa à pessoa de Deus. O primeiro motor aristotélico, se transforma em Deus criador de todas as coisas. A ciclicidade do universo se transforma em linearidade. As coisas antes eternas, precisam de um começo, e assim teorias como o Big Bang tem seu pressuposto fundamentado.

O "eterno retorno" que antes era a "teoria" mais aceita, passa a ser algo completamente marginal para a sociedade ocidental, mas ela permanece sendo defendida por alguns. Com o declínio da religião na época do renascimento, novas formas de ver o mundo vem à tona. A revolução científica do Século XVII dá ao homem novas formas de ver o mundo, para além da física aristotélica e permite a formulação de novas teorias que não mais pautassem na linearidade do estagirita.

Giordano Bruno foi queimado por propor a existencia de mútliplos universos, Galileu teve que se retratar perante a igreja por conta das novas descobertas que iam contra a metafísica aristotélica aceita até o momento... Estas idéias, mesmo que incipientes possibilitam uma espécie de "renascimento" de uma nova forma de ver o mundo.

Após a filosofia de Hegel, sabemos que há um questionamento muito forte sobre Deus. O ateísmo de Feuerbach aparece como explicação "final" para a "crítica da religião" como nos diria Marx. O materialismo ganha força novamente, a explicação das coisas não mais precisam passar por Deus, e ele não precisa existir para que nossas explicações façam sentido. Pode-se (e deve-se) explicar as coisas sem Deus, afinal, a crítica o eliminou das "coisas que podem ser conhecidas". Tendo retornado ao materialismo a idéia de "eterno retorno" aparece de forma muito mais tentadora que a idéia linear baseada em um início inteligente. O materialismo aleatório de Althusser acaba por remeter novamente a Epicuro e a idéia de Clínamem. Um retorno àquilo que era tão caro aos gregos.

Na pós-modernidade, Nietzsche exarceba esta posição tomando a idéia de eterno retorno um ponto alto de sua filosofia. Mesmo que Heidegger tenha visto em Nietzsche um último "defensor" de uma metafísica, podemos ver como que a idéia de eterno retorno do mesmo se vincula a uma visão mais materialista que propriamente "metafísica". (Claro que se fôssemos entrar nesta discussão, o post ficaria enorme).

Mas onde queremos chegar com esta "revisão" na história da filosofia sobre circularidade ou linearidade?

Acredito que para o último dia do ano, a reflexão é bastante importante, afinal, podemos encarar o novo ano como por um viés de "eterno retorno do mesmo" ou em uma espécie de "linearidade".

Para os que veem da primeira forma, o ano novo significa o início de um novo ciclo, uma nova oportunidade para realizar aquilo que ainda não se realizou no ano que passou. Morte e ressurreição. Finda-se o velho, renasce o novo. A esperança que aparece a cada último dia do ano. Sempre há aqueles que veem o eterno retorno como forma de desalento, como mesmice, como indício de que "nada vai mudar", apenas os desespernaçosos são capazes de assimilar a coisa desta forma. O eterno retorno não remete ao tédio, mas sim à esperança.

Para quem ver o ano novo como linearidade, acaba tendo a idéia de que a cada dia que passa estamos mais próximos do fim, mais próximos de "cumprirmos" nosso papel no mundo, e há ainda os que acreditam que o fim terreno levará a uma vida eterna, longe da linearidade, um início sem fim, uma imortalidade.

O ano novo acaba por nos remeter a esta dinamica tão cara a filosofia, tão cara a nós enquanto humanos, mas infelizmente "esquecida" pela dinamica da sociedade atual.

Muitas coisas poderiam ser ditas sobre isto, vários detalhes da história da filosofia caberia aqui, mas se fôssemos fazer isto, teríamos que escrever um livro para mostrar como que a idéia de linearidade e ciclicidade se entrelaçam na história do pensamento ocidental. Talvez este seja um bom projeto para levar a cabo, embora várias coisas já tenham sido escritas sobre o tema, inclusive uma obra muito interessante sobre isto seria o livro do Koyré "Do mundo fechado ao universo infinito". O intuito desta reflexão é apenas nos fazer refletir sobre a forma como vemos o mundo, como vemos a vida para que a partir disso, possamos ser humanos melhores...

Que este texto sirva de reflexão para este novo ano que se inicia...

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Pensando em teologia...







"Pelo fato de representar o ente enquanto ente é a metafísica em si a unidade destas duas concepcoes de verdade do ente, no sentido geral e do supremo. De acordo com sua essencia ela é, simultaneamente ontologia no sentido mais restrito e teologia. A essencia ontoteológica da filosofia propriamente dita (prótete philosophia) deve estar, sem dúvida, fundada no modo como lhe chega ao aberto o ón, a saber, enquanto ón. O caráter teológico da ontologia nao reside, assim, no fato de a metafísica grega ter sido assumida mais tarde pela teologia eclesial do cristinaismo e ter sido por ela transformada. O caráter teológico da ontologia se funda, muito antes, na maneira como, desde a antiguidade, o ente chega ao desvelamento enquanto ente. Este desvelamento do ente foi o que propiciou a possiblidade de a teologia cirsta se apoderar da filosofia grega"

Heidegger em seu livro "Que é Metafísica? p. 261


"A metafísica pensa o ente na sua totalidade conforme seu ser, mas pensando este ser, mas pensa este ser platonicamente como idéia, modernamente como representacao de objetos e finalmente como vontade de poder. Assim a metafísica é a doutrina do ser-do-ente (ontologia). Esta ontologia aceita como evidente para o fundamento do ser a presenca constante. O ente pode ser fundado no ser como presenca constante, e por isso, também disponível. mas o ser precisa de fundamento para que possa ser o ser constantmente presente. Assim, a metafísica acaba por procurar aquele ente que de modo especial, preenche a exigencia da presenca constante. Ela encontra esse ente no divino subsistente em si, no denominado “theion”. Com isso, a metafísica nao é só a fundamentacao do ente no ser, mas também fundamentacao do ser no ente supremo, no “theion”, portanto teologia. Justamente porque fundamentada, ela é uma “-logia”.
Assim ela é onto-teo-logia."

Poeggeler sendo citado por Ernildo Stein no livro "O abismo entre Ser e Deus"