quinta-feira, 16 de maio de 2013
30 anos - Um olhar para frente e um olhar para trás
Ensina a contar os nossos dias para que alcancemos corações sábios, já clamava o Salmista. (Sl 90:12)
Eu exalto a alegria (Ec 10:15)
É bom estar no mundo. (Irmãos Karamázov p. 585)
Para mim, todo aniversário meu é um momento para olhar para trás e tentar fazer uma retrospectiva das coisas que aconteceram no ano que passou. Não digo que sempre consigo fazer isso, mas sempre bate aquela nostalgia de que mais um ano se foi, de que mais experiências adquiri; um olhar para o passado como quem procura traçar uma espécie de itinerário percorrido até o momento.
Procura às vezes vazia de sentido, mas muito no espírito daquilo que o salmista nos conclama a fazer.
Este aniversário ainda tem um quê de especial, afinal completo 30 anos. Não apenas mais um ano que passou, mas talvez o início de uma nova fase.
Eu sempre tive a sensação de que aos 30 a pessoa pode dizer de fato que é "adulta". Ela não é mais simplesmente um "jovem". Claro que ela pode ser um "adulto jovem", "jovial", etc, mas a idéia que sempre tive é que os 30 anos marcam uma fase na vida do indivíduo que o coloca no "mundo dos adultos". Pode ser que não faça sentido nenhum isso que falo aqui, mas sempre tive esta sensação, e agora que chego a esta idade, esta sensação bate com mais força.
Posso dizer que me sinto satisfeito com o que consegui fazer até agora com minha vida. Não só do ponto de vista econômico, familiar, escolar, etc, mas feliz comigo mesmo. Satisfeito com o como as coisas estão caminhando.
Tenho tudo o que preciso para ter um coração grato. Chego aos 30 em paz comigo, bem resolvido com várias coisas, almejando outras, mas sem planos mirabolantes.
Voltando ao salmista, sempre me perguntei pelo o que será que ele queria dizer com "contar os nossos dias"?
Hoje, já penso que a proposta do salmista é que saibamos contar não apenas como quem enumera os dias, afinal isso faria muito pouco sentido, mas como quem narra seus dias. Ao narrarmos os nossos dias, somos obrigados a olhar para trás, somos forçados a trazer à memória as nossas experiências, os desejos realizados, os fracassos, somos novamente envolvidos em nós mesmos em uma dinâmica que nos leva a olhar para nós e nos envolvermos novamente conosco.
Como todo aquele que narra traz consigo algo de si, assim também nós ao contarmos os nossos dias somos convidados a nos rever, e talvez por isso a conclusão seja o alcance de "corações sábios". Um exemplo muito legal que teríamos seriam os próprios mitos. São narrações que procuram dar sentido ao mundo, colocar ordem diante do caos, dar uma lente para que possamos enxergar as coisas. Estas narrações falam talvez mais de quem enuncia do que de qualquer outra coisa. O mito nos convida a sairmos de nós mesmos, em tentar entender o mundo que nos rodeia, mas tudo isso pelo poder narrativo, o poder da palavra.
O "contar os dias" ainda pressupõe uma consciência ciente da passagem do tempo. Em um mundo que muda cada vez mais rápido, onde somos incitados à idéia de que viveremos para sempre bastando para isso estar "atualizado" das novas tendencias, num constante renovar de si mesmo pela moda, ou pela música, ou qualquer novo produto que se apresenta, a consciência de que os dias estão passando vai-se perdendo. Cria-se a ilusão de que se pode ser "forever young", ou que se pode se esconder da dinâmica do tempo por meio dos diversos produtos oferecidos. Uma tentativa constante de escapar da morte por meio de um "excesso de gozo". Tentativa fracassada de subir ao Olimpo, ou voar como Ícaro. Fracassada pela própria dinâmica da vida que tem por definição um fim do qual não podemos escapar por mais que tentemos adiar.
A consciência da morte nos leva a valorizar mais a vida, mas quando a morte é "esquecida", a vida se perde em um mero "viver-na-busca-de-um-gozo". A consciência do tempo nos faz olhar para o futuro, nos faz perceber que a cada dia que passa a morte se aproxima de nós, pois nós caminhamos em direção a ela a cada momento que passa. Os dias que passam tem fim, e esta consciência nos faz valorizar ainda mais o tempo que nos resta. Nos incita à alegria, ao buscar uma vida que tenha sentido para além do mero acúmulo de dias...
Chega a ser piegas dizer que "somos aquilo que nossas experiências fizeram de nós", mas acredito que somos aquilo que nós fizemos com aquilo que as experiências fizeram de nós, ou seja, não somos passivos diante das experiências que nos moldariam da forma como elas quisessem, somos antes de tudo ativos, livres para dar um sentido positivo ou negativo às diversas experiências pelas quais passamos. Este sentido é dado por nós mesmos no decorrer da caminhada que percorremos.
Dessa forma, olho para trás nestes 30 anos de existência e me vejo em um bom lugar. Tenho uma família maravilhosa, amigos maravilhosos, pessoas com quem me importo e se importam comigo de forma inefável. Isto para mim é extremamente significativo e tenho muito o que agradecer por isso.
Chego aos 30 bem consciente de várias limitações minhas, consciente de que não posso fazer tudo o que gostaria, de que abrir mão das coisas não é sinal de fracasso, isso eu penso ser de um ganho enorme para a minha vida e para quem me rodeia.
Ao mesmo tempo olho para frente, tendo a consciência de que posso alcançar várias coisas que ainda não alcancei, posso viver várias coisas que ainda não vivi, mas tendo em mente que o puro gozo por si só não satisfaz o desejo de sentido que em mim habita. Olho para a frente, mas tendo a consciência de que nada dura para sempre, de que a morte se impõe a todos de forma inexorável.
Mas sabendo do fim ao qual todos estamos destinados, busco viver a vida de forma que ela possa ser inefável por tamanha beleza.
Bons 30 anos vividos até aqui. Que venham os próximos 30 , e depois os próximos 30.
Filósofo. Especialista em Teologia. Mestre em Filosofia. Doutor em Psicologia. Doutor em Filosofia.
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