sexta-feira, 25 de junho de 2021

Uma pequena sistematização das vertentes do protestantismo

 

Igreja Anglicana da Dinamarca

 

Esse texto surge como resposta a um pedido de uma querida aluna depois de algumas aulas sobre o tema do protestantismo. Desta forma, me propus a fazer uma pequena sistematização sobre as vertentes do protestantismo que essa querida aluna me solicitou.



O protestantismo começa com Lutero no século XVI (1517) com as suas 95 teses contra a igreja católica que desembocou no movimento de ruptura de Lutero com a Igreja. Sabemos que Lutero nunca quis sair da igreja católica, mas propunha uma reforma, pois via que a Igreja tinha se afastado dos princípios básicos do cristianismo. 

Lutero era agostiniano, então a sua visão sobre o homem, sobre o pecado, sobre o livre-arbítrio eram basicamente agostinianas, ou seja, na visão luterana, o homem nasce com o pecado original que é fruto do pecado de Adão, o livre-arbítrio depois da queda não pode ser entendido de maneira ampla, e o homem é um pecador já quando nasce devido ao pecado de Adão que todos teriam herdado. A salvação é fruto exclusivo da graça de Deus e o homem está de alguma forma já predestinado à salvação ou à perdição. Hoje temos em BH a igreja Luterana do bairro Serra que é liderada por uma pastora lésbica. 



Calvino é um dos reformadores que leva o protestantismo  para a França e lá se torna a grande figura propagadora da reforma luterana. Os pontos defendidos por Calvino são basicamente os mesmos de Lutero, no entanto Calvino é um pouco mais hard em relação à condição de pecado do homem, o que o calvinismo chama de “depravação total”, ou seja, o homem é impossibilitado de fazer o bem por si só, mas apenas pela graça de Deus ele é capaz de fazê-lo. Do ponto de vista da relação com a Igreja Católica, enquanto Lutero propunha uma reforma da Igreja, Calvino se mostrava bastante cético se isso seria possível, e não queria uma reforma, mas sim uma nova Igreja dos moldes da Igreja Primitiva. Os grandes representantes do Calvinismo hoje no Brasil são os presbiterianos. O presbiterianos são de origem calvinista e mantém basicamente as doutrinas de Calvino para os dias atuais, ou seja, a noção de predestinação, depravação total do homem, etc. Não preciso dizer, obviamente, que esses grupos não são homogêneos, ou seja, dentro dos presbiterianos há diversas vertentes, assim como dentro do metodismo, do anglicanismo, etc. (Só pra vc ter ideia, a primeira igreja presbiteriana de BH, ali na Rua Ceará é extremamente fundamentalista, ao passo que a segunda igreja presbiteriana, ali no Barro Preto é mais liberal, e a oitava igreja presbiteriana ali perto do Minas Shopping já caminha de braços dados com o neopentecostalismo)



Jacó Armínio, de onde deriva o termo “Arminianos” era um teólogo holandês que se colocou contra a doutrina calvinista de depravação total e predestinação da salvação. Para Armínio, o livre-arbítrio do homem poderia sim fazê-lo “optar” pela salvação, ou rejeitá-la, i.e., a presciência de Deus não era predestinatória. Na visão arminiana, o homem não nasce predestinado à salvação, mas ela é fruto do livre-arbítrio do homem, embora também fruto apenas da graça divina. Armínio não defendia o pelagianismo, mas mantinha a noção de graça salvífica de Deus, mas sem manter a noção de predestinação a la Lutero e Calvino. 

 

Os pontos principais da disputa entre Calvino e Armínio podem ser vistos aqui (que está excelente nesse tópico)



Esses debates todos datam do século 16 e início do século 17 entre Alemanha, França e Holanda. Duraram bastante tempo e por questões históricas/políticas/sociais geraram várias outras questões. 



O Anglicanismo é uma vertente que mescla a Igreja Católica com a Igreja reformada, e é fruto do casamento do Rei Henrique VII  com Catarina de Aragão. Essa história é bem conhecida por vc com certeza. Via de regra, do ponto de vista teológico a igreja Anglicana se mostra um pouco mais “aberta” que o Calvinismo e se coloca como um meio-termo entre o protestantismo e o catolicismo. Do ponto de vista teológico ainda os anglicanos são bastante liberais e isso tem feito com que geralmente eles estejam na vanguarda de diversos temas contemporâneos como casamentos homoafetivos, ordenação de mulheres aos cargos de liderança, etc.



O metodismo foi fundado por John Wesley que era membro da Igreja Anglicana. Wesley não queria sair da igreja anglicana, da mesma forma que Lutero não queria sair da Igreja Católica, mas por diversos motivos acabou sendo desligado do anglicanismo. A proposta metodista é diretamente ligada à reforma protestante e por ser derivado do anglicanismo também se mostra uma igreja um pouco mais aberta do ponto de vista teológico. O metodismo surge no século 18 e já é fruto de um desenvolvimento do protestantismo. Entre Calvino e Armínio, a doutrina metodista se apóia nas ideias de Armínio, ou seja, defende que a salvação é, conforme o ensino bíblico, baseada na Graça de Deus, que atua em três dimensões: Graça Preveniente (preparando para a salvação), Graça Justificadora (concedendo o perdão) e Graça Santificadora (renovando a natureza humana corrompida); o alvo é a plena santificação e a perfeição cristã (amor perfeito a Deus e ao próximo). Ser santificado não é ser como Deus, e sim tornar-se mais humano, ou seja, obedecer ao plano original que Deus tinha para o Ser Humano.



Igrejas Batistas são diversas denominações cristãs, com forma de governo congregacional, cuja doutrina básica se dá na salvação mediante a fé somente, tendo como regra de fé e prática a Bíblia Sagrada,. As igrejas batistas não possui hierarquia, tampouco governo único, visto que é princípio da maior parte das Igrejas Batistas o governo local da Igreja. Os batistas entendem haver duas ordenanças de Jesus Cristo: a Ceia do Senhor e o Batismo, sendo que este último só é realizado mediante a imersão do indivíduo na água, já em idade suficiente para ter consciência do ato e desejá-lo por iniciativa própria.A Igreja Batista é uma denominação histórica, cujas origens remontam à Inglaterra no início do século XVII. Tornou-se, com o tempo, uma das mais importantes denominações protestantes, com muitas igrejas na própria Inglaterra e também nos Estados Unidos, de onde missionários foram enviados a todas as partes do planeta. No Brasil, os primeiros missionários chegaram cerca de 150 anos atrás, tendo fundado, desde então, igrejas de Norte a Sul no país.

 

É sem dúvida o ramo protestante mais famoso no Brasil e o mais difundido. E talvez por isso seja o que tem mais tipos diferentes dentro de si. Há igrejas batistas que adotaram o neopentecostalismo (aqui em BH, por exemplo, a Batista da Lagoinha, Getsêmani, Batista Central, etc.), há batistas tradicionais como a primeira igreja batista do Barro Preto na praça Raul Soares, etc. Pelo fato de não ser centralizada, nem ter nenhum tipo de liderança (há pequenas convenções, mas com alcance muito limitado) as igrejas batistas são extremamente múltiplas e de visões teológicas extremamente diferentes. 

 

Bem, aí está de maneira bem sistemática as denominações chamadas de “protestantes” na contemporaneidade. Percebe-se que nas denominações históricas, o debate entre Calvino e Armínio é determinante para a teologia de cada denominação, mas à medida que o tempo vai passando esse debate vai ficando um pouco mais esquecido e as teologias das igrejas vão se atualizando. Do ponto de vista teológico esse debate é importantíssimo e determina muitas posições sobre diversas questões, mas diversos pontos contemporâneos não são contemplados por esse debate (obviamente, pois no século 16,17,18, o debate é outro). 

 

O que a teologia sempre deve estar atenta é ao dançar dos tempos para que possa dar respostas novas a debates atuais.