O cenário político brasileiro tem sido objeto de inúmeras análises, postagens, reportagens e toda a gama de comentários possíveis analisando cada decisão, cada novo acontecimento. Isso tem um quê de interessante, mas ao mesmo tempo aponta também para o teor das discussões na era das redes sociais. Na maioria das vezes as discussões são vazias e giram em torno dos mesmos comentários, das mesmas pessoas de sempre criando um loop incrível de retro-alimentação argumentativa.
Um caso interessante que gostaria de comentar brevemente é a suposta nomeação do pastor Marcos Pereira da Universal do Reino de Deus, para o Ministério da Ciência e Tecnologia. Tirando a obviedade do jogo político envolvido, uma vez que o PRB (que todos sabemos pertencer à Igreja Universal ) votou unânimamente a favor do processo de Impeachment na Câmara dos deputados e a promessa de cargos e ministérios é uma prática comum no jogo político brasileiro (e por que não dizer no jogo político mundial?), soou bastante estranho esse tipo de indicação (que acabou por não ser concretizada) dada toda história da relação entre a ciência e a igreja no ocidente. Desde a relação mais antiga que envolvia casos como Galileu, Giordano Bruno com a Igreja Católica, até casos mais recentes da sempre conturbada "bancada evangélica" com suas propostas "curiosas" referentes à educação, ética, etc.
A princípio o fato de Marcos Pereira ser evangélico e pastor da Universal não deveria nos colocar em uma posição defensiva já pré-julgando que ele fará um péssimo trabalho, ou que fará excluir dos livros didáticos temas como o evolucionismo e exigir que todas as escolas passem a ensinar apenas o criacionismo bíblico, ou qualquer coisa do gênero. Assumir esse tipo de postura aponta apenas para o fato de que deixamos nos levar por diversos esteriótipos (que inclusive várias vezes defendemos que não devemos ter esse tipo de atitude) que em nada contribui para uma análise mais atenta da situação. Quem sabe ele não fará um bom trabalho à frente do ministério da Ciência e Tecnologia? Cabe a nós a dúvida em relação ao futuro.
Pertence ao senso comum a ideia de que Religião e Ciência até hoje estariam brigando a respeito de criacionismo e evolucionismo. Embora esse tipo de discussão seja muito forte em vários estados norte-americanos, como Texas, aqui no Brasil a coisa se dá de forma um pouco diferente. Em uma pesquisa realizada pelo datafolha em 2010 é mostrado que 59% dos brasileiros acreditam em Deus e em Darwin, ou seja, seria bem possível Deus ter criado o mundo e ele funcionar a partir da evolução das espécies, ou então, o mundo não ser criado por Deus, mas ser comandado por ele em seu processo evolucionário. Para a maioria dos entrevistados, as duas opções são bem plausíveis e não há nenhum tipo de contradição entre elas, mas podem coexistir tranquilamente. Essa pequena pesquisa aponta um dado interessante que foge às vezes de uma análise mais rápida.
A relação entre Ciência e Religião se alterou bastante nos séculos XX e XXI. Podemos dizer que a relação que antes era de oposição tem caminhado cada vez mais para uma relação de cooperação entre as duas áreas de conhecimento. Depois de ter sido relegada a obscurantismo, irracionalidade, quimeras imaginárias pelo iluminismo, a Religião passou a ganhar muito espaço a partir do Romantismo alemão e foi ganhando cada vez mais espaço até mesmo na pesquisa científica. Um filósofo que deu um passo decisivo no debate entre as duas áreas foi Wittgenstein (1889-1951) que apontava para o fato de que ambas as disciplinas falavam de coisas diferentes. Enquanto a Religião se preocuparia com o sentido para a vida, a Ciência se preocuparia em uma descrição objetiva das coisas no mundo. Se elas estão falando de coisas diferentes, o erro se dá quando uma das áreas quer legislar em campo alheio. A separação das áreas proposta por Wittgenstein abre um caminho para o processo de cooperação que citávamos acima. Pelo menos no Brasil, a pesquisa do Data Folha registrada acima mostra que se encontrou um jeito bastante peculiar de conciliar os dois ramos de conhecimento.
Dentro do debate mundial há os que defendem que Deus pode ter criado o mundo por meio de um "Big Bang" e a partir daí Deus "coordenaria" a evolução das espécies colocando novamente todo o mundo dentro do Seu propósito. Essa posição se torna uma versão clássica de um Teísmo que mantém a noção criadora de Deus, mas dá a ela um ar mais dialogal com as pesquisas da física dos séculos XX e XXI. Próximo a essa perspectiva há aqueles que pensam em Deus como uma espécie de "Design Inteligente", ou seja, uma espécie de refinamento da posição Deísta (aquela segundo a qual Deus coloca o mundo em movimento, mas não interfere nele; típica da idade moderna e que pode ser remetida à noção de "primeiro motor imóvel de Aristóteles) que ainda hoje é vista por muitos como uma "necessidade lógica" na explicação causal do mundo. Uma outra posição também que tem ganhado bastantes adeptos e que se mostra também uma proposta dialogal é a tentativa de conciliar noções da física quântica vinculadas à noção de energia com as filosofias e religiões de matrizes orientais tais como o Taoísmo, para ficarmos com apenas um exemplo. Nesta linha os trabalhos de Leonardo Boff e Fitjof Capra se mostram como bons exemplos.
O que se percebe é que o diálogo entre Religião e Ciência se distanciou bastante do que comumente vemos sendo propagado nas redes sociais e discussões sobre o tema e que a possível nomeação do pastor Marcos Pereira para o ministério de Ciência e Tecnologia trouxe novamente a tona no cenário brasileiro. As diversas reações adversas propagadas pelo simples fato dele ser um pastor que coordenaria um ministério da ciência se mostraram serem muito mais fruto de um pré-conceito do que do fato de estarem ancoradas em algum conhecimento sobre o tema na atualidade. Esse tipo de julgamento apressado deve sempre ser evitado para que não incorramos no erro que apontamos nos outros.
Religião e Ciência são duas áreas de produção humana em que cada uma delas visa um fim específico. A Religião procura falar do sentido da vida, procura ser uma possível orientação para o sujeito se guiar diante das adversidades da vida ao mesmo tempo que oferece consolo e uma esperança para ele. A Ciência por sua vez está preocupada em desvendar os mistérios do funcionamento do mundo, a forma como ele começou, preocupada em ajudar o indivíduo a se relacionar melhor com a natureza por meio de suas descobertas, tecnologias, etc. Por mais que a Ciência investigue e diga todas as possíveis causas do mundo, o funcionamento da natureza, a forma como se dá o crescimento e a evolução dos seres, ainda assim, ela nem sequer tocou no problema sobre o sentido da vida, o sentido do mundo, o sentido da existência. Essa diferença é crucial para entendermos a possibilidade de um diálogo saudável entre o âmbito da Religião e o âmbito da Ciência. Dependendo de nossa "filiação ideológica" podemos privilegiar um campo em detrimento do outro, mas de forma alguma podemos menosprezar um desses campos no intuito de defender o outro, pois isso apontaria para um total desconhecimento da atualidade do debate em questão.
Fica então o convite para que conheçamos as duas áreas de conhecimento e assim possamos manter vivo o diálogo entre elas.
Dentro do debate mundial há os que defendem que Deus pode ter criado o mundo por meio de um "Big Bang" e a partir daí Deus "coordenaria" a evolução das espécies colocando novamente todo o mundo dentro do Seu propósito. Essa posição se torna uma versão clássica de um Teísmo que mantém a noção criadora de Deus, mas dá a ela um ar mais dialogal com as pesquisas da física dos séculos XX e XXI. Próximo a essa perspectiva há aqueles que pensam em Deus como uma espécie de "Design Inteligente", ou seja, uma espécie de refinamento da posição Deísta (aquela segundo a qual Deus coloca o mundo em movimento, mas não interfere nele; típica da idade moderna e que pode ser remetida à noção de "primeiro motor imóvel de Aristóteles) que ainda hoje é vista por muitos como uma "necessidade lógica" na explicação causal do mundo. Uma outra posição também que tem ganhado bastantes adeptos e que se mostra também uma proposta dialogal é a tentativa de conciliar noções da física quântica vinculadas à noção de energia com as filosofias e religiões de matrizes orientais tais como o Taoísmo, para ficarmos com apenas um exemplo. Nesta linha os trabalhos de Leonardo Boff e Fitjof Capra se mostram como bons exemplos.
O que se percebe é que o diálogo entre Religião e Ciência se distanciou bastante do que comumente vemos sendo propagado nas redes sociais e discussões sobre o tema e que a possível nomeação do pastor Marcos Pereira para o ministério de Ciência e Tecnologia trouxe novamente a tona no cenário brasileiro. As diversas reações adversas propagadas pelo simples fato dele ser um pastor que coordenaria um ministério da ciência se mostraram serem muito mais fruto de um pré-conceito do que do fato de estarem ancoradas em algum conhecimento sobre o tema na atualidade. Esse tipo de julgamento apressado deve sempre ser evitado para que não incorramos no erro que apontamos nos outros.
Religião e Ciência são duas áreas de produção humana em que cada uma delas visa um fim específico. A Religião procura falar do sentido da vida, procura ser uma possível orientação para o sujeito se guiar diante das adversidades da vida ao mesmo tempo que oferece consolo e uma esperança para ele. A Ciência por sua vez está preocupada em desvendar os mistérios do funcionamento do mundo, a forma como ele começou, preocupada em ajudar o indivíduo a se relacionar melhor com a natureza por meio de suas descobertas, tecnologias, etc. Por mais que a Ciência investigue e diga todas as possíveis causas do mundo, o funcionamento da natureza, a forma como se dá o crescimento e a evolução dos seres, ainda assim, ela nem sequer tocou no problema sobre o sentido da vida, o sentido do mundo, o sentido da existência. Essa diferença é crucial para entendermos a possibilidade de um diálogo saudável entre o âmbito da Religião e o âmbito da Ciência. Dependendo de nossa "filiação ideológica" podemos privilegiar um campo em detrimento do outro, mas de forma alguma podemos menosprezar um desses campos no intuito de defender o outro, pois isso apontaria para um total desconhecimento da atualidade do debate em questão.
Fica então o convite para que conheçamos as duas áreas de conhecimento e assim possamos manter vivo o diálogo entre elas.
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