segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Teologia Apofática - A chamada Via Remotionis







A teologia negativa, ou teologia apofática é um campo da teologia iniciado por Dionísio Pseudo-Areopagita que afirmava que sobre Deus não haveria discurso possível, ou seja, sobre Deus não há nada que possa ser dito, e para tentar explicar isso a filosofia medieval cunhou o termo que ficou conhecido como "Via Remotionis".

A via remotionis é o modo de falar negativamente a respeito de Deus o que difere do conceito de negação. A função da negação é excluir determinado objeto de um campo predicativo podendo com isso definir determinada coisa a partir do que ela não é. A diferença entre a negação e a via remotionis é ilustrada a partir da figura do escultor que trabalha com um bloco; o trabalho do escultor é feito de forma a possibilitar que o material trabalhado crie a forma desejada, e essa forma é dada a princípio, ou seja, toda escultura é em si uma imitação de um objeto. O que há ali é a "remoção" daquilo que não é a escultura e ao remover o que sobra da pedra algo ali vai se delimitando.

A música, por exemplo, não pode ser esculpida por não ter uma forma que se adeqüe a um bloco de mármore . A função da via remotionis é mostrar que nada pode ser dito a respeito de Deus. A via remotionis mostra que não existe campos predicativos aos quais Deus e seus atributos se encaixem. Se tentamos colocar Deus dentro de campos predicativos através de negações sucessivas o que se segue é o esgotamento de todos os campos predicativos inteiros. Falar de um objeto, é colocá-lo dentro de um campo predicativo. Com Deus isso é impossível. E é exatamente isso que a via remotionis vem mostrar. 

Deus não é um objeto dizível, e por isso qualquer tentativa de explicação Dele deve obrigatoriamente levar ao silêncio, pois podemos falar de objetos que estão no mesmo plano do dizível, e dentro de um campo de predicação, e Deus não está neste plano e nem em nenhum outro pois está acima de todas as coisas e por isso o dizível não se aplica a Ele. Portanto, assim como para esculpir algo, o escultor precisa de um objeto a ser imitado, para falarmos algo a respeito de alguma coisa, precisamos ter um campo de predicação desse objeto que lhe seja pertinente. Deus não está em nenhum campo de predicação, por isso assim como uma música não pode ser esculpida em um bloco de mármore, não podemos falar nada a respeito de Deus pois Deus não é um objeto dizível.

A mesma ideia de uma teologia apofática é evidenciada muitos séculos depois na proposta de Wittgenstein em seu famoso "Tractatus logico-philosophicus" que se encerra com as palavras: "Sobre o que não se pode falar, deve-se calar", ou seja, a via proposta por Wittgenstein acaba por se resumir ao silêncio sobre o místico, incluindo aí a figura de Deus. Na mesma esteira podemos também colocar o pensamento de Mariah Corbi em que o que restaria a respeito de um discurso sobre Deus seria apenas o silêncio. A teologia apofática também é bastante comum nos textos de teólogos ortodoxos advindos do antigo império bizantino tais como Nikolai Berdiaev e mais recentemente Mikhaill Epstein e sua proposta de Religião mínima. 

A teologia apofática até hoje continua inspirando diversos autores e a sua fecundidade aponta para os limites da nossa linguagem ao tentar dizer algo sobre Deus. Nessa impossibilidade se evidencia a possibilidade de uma mística e de uma postura diferente em relação a isso que chamamos Deus que estaria para além de toda predicação. 

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