terça-feira, 3 de novembro de 2015

Um arrastar dos dias...


 




Por que não vens como a relva que cai mansamente sobre todas as coisas?
Por que te demoras em trazer conforto aos corações aflitos?
Por que diante do desespero e da dor não te mostra a nós, mas se esconde?
Por que ?
Será que haverá explicação possível para as angústias que nos assolam?
Que insistem em chegar sem serem convidadas?
Que fazem morada no mais íntimo do nosso coração?
Será que essa é a nossa condição enquanto humanos?
Será que a ideia da angústia como revelação estupefata do nada que nos assola é a mais correta?
Como não cair em um grande abismo diante das diversas assolações que aparecem?
E se nem mesmo abismo houver, mas o mais aterrador nada diante de nós?

Claro que é sempre possível se esconder dessas questões, é sempre até aconselhável não se deter muito sobre elas para que o desânimo não tome conta do coração. Mas se aquilo nos invade, como fechar as portas para esse hóspede não desejado?
E se esse hóspede já for um morador fixo da casa? E se isso que parece vir de fora não vier do mais íntimo a nós mesmos?
Curioso pensar que o espaço acima de nós, os incontáveis planetas, as incontáveis estrelas são para nós extremamente desconhecidos, assim como as profundas águas, as zonas abissais onde reina a escuridão e seres desconhecidos. Nesse meio entre duas grandes icógnitas nós habitamos sem saber muita coisa sobre muita coisa. E em nós também habita uma imensidão desconhecida. Acima de nós, abaixo de nós, em nós, somos rondados pelo mistério e isso talvez seja o que mais nos espanta durante a vida.

Médico, cura-te a ti mesmo ! (Lc 4,23)
Por que as mãos e as palavras que a tantos já ajudaram em nada auxilia agora em momento de tamanha angústia e dor?
Por que não diz para si aquilo que sempre disse aos outros?
Por que para ti as palavras são tão sem efeito? Será que se considera melhor que os outros a ponto de não conseguir nem mesmo se ajudar?  
Será que a dor é tão grande que nenhuma palavra nem sequer toca a ferida?
Mas quem será capaz de, de fato, aplacar essa dor senão eu mesmo?
Como Jó clamo para que haja auxílio e o que se ouve são apenas mais perguntas, mais indagações, convites a vasculhar outras dimensões de si mesmo. Nenhuma resposta.
São tão tristes os dias, as alegrias se mostram tão pequenas que qualquer hora em que aparecem me agarro a elas como se nunca mais fossem voltar. Nesse afã de manter as pequenas felicidades perto é como se fizesse de tudo para que elas não ficassem, pois o empolgar-se demais soa estranho, soa desespero, faz com que se queira distância de quem lida assim com pequenas coisas.

E assim o caráter obsessivo vai crescendo, e quem mais sofre com isso senão os mais próximos? A quem mais é dado o peso de suportar tudo isso senão àqueles em quem confiamos? Mas até que ponto eles também não sucumbirão diante de tão árdua tarefa? Será honesto com eles também colocar sobre ombros já tão cansados tamanho peso e dor? Oh tão triste dinâmica essa desses dias ! Tamanho sofrimento que invade de forma tão profunda que nos faz perder a calma, que nos faz querer apenas dormir para que nada mais nos incomode.
Pra que tentar ser forte diante de um inimigo tão poderoso? Por que não aceitar a fuga como única solução possível e correr para longe dos problemas se fixando em tarefas e mais tarefas? Por que não tentar esquecer esses pensamentos e focar no que não faz sentido, ou faz sentido apenas provisório?

Há, no entanto, uma voz que ressoa. Uma voz que insiste em dizer: "Estou sempre aqui!". Ah como admiro aquela voz. Como valorizo aquelas três palavras. Como me apego a elas nos dias mais árduos. Talvez seja no repetir incessante dessa voz em minha mente que haja um pequeno fio que me impeça de sucumbir naquele abismo que tudo visa sugar. E quantas outras vozes não serei capaz de ouvir dizendo a mesma coisa? Se pelo menos os outros soubessem do turbilhão de coisas que acontecem, se eles pelo menos tivessem noção de que por trás de tamanha tranquilidade habita uma desolação inexplicável que avança durante os dias e faz com que me arraste dia após dia. Se pelo menos eu fosse capaz de clamar por essas outras vozes para que elas se fizessem ouvir para mim. Se pelo menos eu tivesse força para isso...




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